domingo, 12 de fevereiro de 2023

O pesadelo

Sempre que tenho (mais) dores durante a noite sou assaltada por pesadelos, muitos deles em torno de dramas familiares passados.

No entanto, esta noite fui agraciada com um pesadelo com plot. Para simplificar o entendimento, digamos que temos dois personagens, Tom e Lilly.
Eu controlo o Tom enquanto "player" de um jogo macabro e portanto penso através dele e sobre ele, enquanto "narrador" ou jogadora. Tom é o personagem que eu "controlo".
O ambiente é distópico e parece passar-se num bunker onde há evidências que lá fora o mundo é inóspito. Todos os personagens tiveram as suas memórias apagadas, menos os "outros" que criaram o bunker ou estão a usá-lo para um jogo macabro de sobrevivência.
O sonho é vívido mas sente-se a opressão, como que um "Silent Hill". Tom tenta apoiar Lilly, ele um rapaz com aspecto saudável embora pobre e ela com a pele muito branca e o cabelo aloirado, com um ar magro e frágil.
Uma das opções que me é colocada é que Lilly tem que escolher uma de várias opções que são apresentadas e que irão deixá-la numa situação de desvantagem. Uma das opções é que tudo o que ingerir ou beber vai dar-lhe apenas metade da vida ou energia na "barra". Parece-me uma péssima ideia, Lilly já é ou está fragilizada que chegue. A outra opção é "dar-lhe" um cão, Dabbo, que a irá proteger de situações de perigo. Parece-me muito melhor ideia, no entanto, é explicado que sempre que Dabbo intervir ou interagir com Lilly, ela terá que lhe pedir desculpa por o colocar em situações de perigo ou por ser uma liability. A idiea parece-me incrivelmente cruel visto que é certo que Lilly irá precisar de Dabbo e isso vai interferir no laço entre eles e estilhaçar a mente de Lilly.
Percorro as páginas freneticamente à procura da opção "menos má".

Acordo. Senti imediatamente que tenho uma dor extrema no pescoço e na lombar que me migra até aos joelhos, mas continuo estupidamente ensonada, viro-me com um gemido e volto a dormir.

A sala é outra, Tom e o grupo conseguiram trazer Lilly até a outra zona do labirinto sem terem escolhido de imediato, a opção que irá colocá-la em desvantagem.
Descobrimos mantimentos e Tom insiste que Lilly coma alguma coisa, especialmente enquanto a sua barra de vida não está a ser subida pela metade, uma vez que comparativamente com a opção de Dabbo e os de desculpa ou o sentimento de culpa, intuo que o resto da lista terá opções ainda piores.
Descobrimos um dispositivo no meio da comida, e carregamos num botão para correr a informação.
Nele, uma foto dos pés de uma pessoa que pode ser Lilly mas pode ser Tom ou qualquer outro, com um fato que em parte lembra uma espécie de fato protector contra radiação. A pessoa está sentada num banco de madeira, a seu lado um balde onde foi recolhida baba originária de tortura. Está tudo implícito, a tortura não é demonstrada mas eu já estou enquanto Tom e enquanto "player" a recolher-me de horror.
No texto é indiciado que a pessoa é Lilly, que Lilly era casada com Tom que a torturou porque é um insider dentro do grupo. Eu sei que Tom não se lembra de nada disto, afinal eu vejo a mente de Tom que se recolhe em choque e nojo.
Lilly ajoelha-se enquanto arranha o rosto com os dedos, como se quisesse à força arrancar os olhos que viram aquela imagem, aquele texto, aquele balde.
A minha mente corre frenética, ninguém pode provar que aquelas pernas, aquele balde, aquela pessoa é Lilly. Pode ser ela, pode ser Tom, pode não ser ninguém do grupo.
Mas é certamente alguém. O balde tem baba? Tem sangue? Tem alguma outra coisa?
A minha mente gira, fecho os olhos no sonho, porque não quero ver.
Tom está quebrado mas segura Lilly pelos ombros enquanto tenta racionalizar que na verdade, precisam sair dali. Talvez fosse marido dela, talvez lhe tenha feito mal, talvez não.
Ninguém se recorda de nada, mas o que importa é que devem fugir.
Convenço-me disso mesmo, vejo outro dispositivo com fotos de Dabbo.
O cão existe mesmo, estará morto? Afasto o dispositivo porque Lilly não consegue ver mais nada e eu também não. Na verdade, temos todos que sair dali.

Tateamos as salas, começo a acordar, a dor está presente e lateja-me a cabeça e a lombar, viro-me entre dois mundos, não sei se quero acordar para este mundo onde o meu corpo se está a verter em dor, ou se prefiro continuar num mundo tão horrendo criado pela minha própria mente.

Talvez o meu corpo a querer fazer sentido da dor que sente enquanto dorme.

Finalmente acordo, viro-me na cama, sei que preciso de me levantar porque a dor é horrível e vai melhorar quando finalmente me levantar do colchão, mas há dias em que não consigo.
Fico num jogo entre o que é pior, entre a dor física ou a falta de energia para me erguer da cama.
O meu marido está ao meu lado e acorda e peço-lhe que se levante para me ajudar a levantar. Ele abre o estore e aos poucos vou verdadeiramente acordando.

Digo-lhe que hoje não consigo cozinhar, que vamos comprar frango assado, que não consigo sequer levantar-me sem ajuda.
A ajuda existe e portanto acabo por me levantar, a cabeça a latejar de dor e de imagens horrendas dum pesadelo noturno.
Aos poucos a dor diminui e consigo pôr o almoço em marcha e ir para o banho.

Incrivelmente, ainda não tomei um analgésico.
Mas o dia, ainda agora começou.

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