sábado, 14 de janeiro de 2023

Aprender a estar sozinho

As pessoas parecem ter deixado de se saber definir sem ser através da lente duma relação.

Talvez fruto da forma cada vez mais desapegada com que as relações familiares ou de amizade se perdem ou e fracturam, as pessoas parecem ter pavor de se saberem sozinhas. 

Há alguns anos coleccionei algumas relações profundamente infelizes por motivos que se assemelham mais com sobrevivência do que um verdadeiro criar de ligação/emoção. Os baixos vencimentos e o mercado habitacional empurra as pessoas para tentarem sustentar relações condenadas para não terem que voltar à estaca zero e possivelmente ter de regressar a casa dos pais ou outros familiares. 

Com outro tipo de estrutura financeira, tenho noção que teria tido a hipótese de fazer outras escolhas. 

No entanto, há quem tenha essa hipótese e se coloque à mercê de situações pouco estruturadas ou que as suporte, seja porque tem filhos ou porque simplesmente preferem ter companhia a estarem sozinhos, mesmo que tivessem mais paz de espírito solteiros. O que é algo que não consigo entender. Talvez porque não tive esse privilégio (à falta de melhor palavra) quando tive que adiar decisões importantes por falta de meios. Conheço situações de perto de pessoas que poderiam perfeitamente estar sozinhas dum ponto de vista monetário e até emocional, mas preferem uma relação sem grande profundidade ou de amparo mútuo apenas para não se sentirem sós. 

Ironicamente, a maior solidão é estarmos com alguém e ainda assim, sentirmos no nosso âmago que estamos sós. Que num momento de vicissitude estamos por nossa conta. 

Uma pessoa respondeu há tempos ao reparo "não compreendo porque te sujeitas a isto" com a resposta "certamente também tens discussões e maus momentos". E sim, todos temos discussões e maus momentos, mas quando a generalidade das interações se pautam por atrito e cedências a um ponto que a pessoa deixa de se reconhecer a si própria temos que nos questionar "vale a pena?". 

Mas as pessoas preferem convencer-se que todas as relações são infelizes e condicionadas do que estarem sozinhas até encontrar uma pessoa realmente compatível ou mesmo ficarem sozinhas. Ponto. 

De certo modo, o imediatismo generalizado e o facilitismo das dating apps, não ajuda. É extremamente fácil quando back in the day, tinhas que encontrar alguém por outros meios que implicavam maior custo social e temporal. 

Não tenho nada contra dating apps, embora o Tinder em particular me pareça baseado num conceito bastante redutor. Mas merece-me alguma reserva que as pessoas não tirem tempo para perceber o que correu mal e respirarem fundo, especialmente se estão em posição de o fazer.

Estar sozinho não é o fim do mundo. Pode ser até bastante libertador e um período de reflexão importante e de maturação da própria pessoa. 

De preferência sem Tinder.

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